Os Sofistas

Physis e Arché

Diante da Natureza, o homem manifesta diversos sentimentos, tais como medo, resignação, incompreensão, espanto e perplexidade. Sentimentos como estes conduzem o homem à busca do conhecimento, como uma estratégia de poder para garantir sua sobrevivência. Estes sentimentos, dentre outros, são considerados os responsáveis por levar o homem á filosofia. A primeira pergunta filosófica, portanto, se apresenta: O que é a physis? Physis – grego – Natureza. Todavia, o conceito é amplo, incluindo, inclusive “a realidade que se encontra em movimento e transformação” (Pensadores, História da Filosofia, p. 24).


Conhecer a physis é conhecer a origem de todas as coisas, sua gênese e manifestação. A partir da pergunta sobre a physis, desenvolve-se o questionamento sobre a arché (arkhé).O período pré-socrático, na Grécia Antiga, foi marcado, portanto, por esta investigação da natureza. Aqui, o objetivo era encontrar a arché, isto é, o princípio primordial, a partir do qual tudo existiu; o princípio único que “comande”, ordene e dirija todas as coisas.


Dentre os pré-socráticos, cito Tales de Mileto, para quem a arché era a água; para Anaximandro, o princípio da physis era o apeíron (ilimitado; indeterminado); Anaxímenes julga que a arché era o ar. Xenófanes de colófon julgava ser a terra. Heráclito de Éfeso “o fogo é o gerador do processo cósmico. Pitágoras argumenta que o mundo é números, afirmando que a harmonia encontra-se na música. É dele a descoberta de que o “som varia de acordo com o comprimento da corda, numa relação proporcional simples” (Ibide.)

O homem é a medida A fase filosófica seguinte foi marcada por um “antropocentrismo” clássico, no qual o homem e suas relações políticas na polis eram os focos de análise e investigação. O início desta fase foi marcado pela presença dos sofistas. Atenas vence a guerra contra os Persas (Dario I) pela disputa da Jônia no século V a. C. e consolida a Democracia na cidade. O filme 300 (Zack Snyder) narra a invasão de Xerxes (filho de Dario) à Grécia.Uma vez instaurada a democracia, a educação surge como valor principal, uma vez que era necessário formar cidadãos aptos á vida pública, capazes, em habilidade e caráter, para administrar a pólis, para tanto, faz-se necessário que sejam bons oradores habilidosos em argumentar em público.


É desta educação, portanto, que se encarregam os Sofistas (sábios). Eles eram estrangeiros, “vendiam ensinamentos práticos de filosofia”, não-cidadãos da pólis e despreocupados dos destinos da cidade. Seu foco educativo centrava-se na oratória e na argumentação retórica em público, sem possuir preocupação com o que tais argumentações tivessem de justo ou injusto, moral ou imoral, sendo estes assuntos de responsabilidade dos cidadãos. Numa discussão sofista vali isto: “Não preciso demonstrar que estou certo, basta provar que você (o opositor) está errado”. Eloquência e sagacidade mental.


Quem já assistiu a uma assembléia parlamentar no Brasil consegue construir uma ideia do que eram as assembléias democráticas gregas, com o diferencial de que no Brasil possuímos a democracia representativa e na Grécia havia a democracia participativa, na qual os cidadãos sentiam a necessidade de desenvolver a habilidade de argumentar em público para persuadir a assembléia e fazer prevalecer seus interesses, sejam pessoais, sejam de “classe”.


Os Sofistas se detinham no desenvolvimento da argumentação, da habilidade retórica, possibilitando o conhecimento de doutrinas divergentes, que, num jogo de palavras aparentemente lógico, convenciam os ouvintes. São sofistas as concepções relativistas, pois para estes, tudo é relativo: não há uma verdade única, absoluta. Portanto, é suficiente que os discípulos aprendam a falar não importa o quê, desde que seja convincente, que fale bem.


Mercenários ou Educadores? A partir da visão dos filósofos Sócrates e Platão que abominavam os sofistas por seu relativismo constante e por cobrar pela transmissão do conhecimento, considerando-os impostores, muitos hoje possuem uma visão equivocada dos sofistas, tomando-os por mercenários do conhecimento. Já alguns que desenvolveram pesquisa apurada e profunda descobriram outra visão mais equilibrada dos sofistas, chegando inclusive à conclusão de que estes sofistas possuíam valores elogiáveis.


Um dos aspectos é o que compartilhar com os próprios gregos a ideia de que o mundo é fruto da criação humana, consistindo e prevalecendo aí exatamente aquilo que os homens julgarem que deva prevalecer em consenso. Não há, portanto, nenhuma instância superior aos humanos que dite e ordene seu mundo, o que há são convenções estabelecidas pelos humanos para, depois, abandonarem-nas.


Nesta forma de pensar, encontrava-se a linguagem, julgada como convenção humana, sem poderes, inclusive, de expressar a verdade, a não ser verdades relativas a qualquer cada homem. Aos sofistas, a partir de Platão, reservaram-se adjetivos como manipuladores de raciocínios, produtores do falso, de ilusores do dos ouvintes. Com certeza, não eram filósofos, mas sim filosofastros.


Afinal de que verdade falava Platão quando afirmava que os sofistas não tinham compromisso com a verdade? Platão referia-se à Aletheia (verdade; realidade), a manifestação daquilo que ‘é’, o não-oculto. Podemos entender Aletheia a partir de Phronésis (sabedoria). Phronésis associa-se à Aletheia (verdade) e a Eudaimonia (harmonia; felicidade). Assim, a perfeita sabedoria estava completa se estivesse relacionada com a verdade e com a felicidade. Ao contrário de Aletheia estava a Doxa (Opinião).No entanto, os sofistas possuíam uma concepção flexível sobre o homem, a sociedade e a compreensão do real. Em tal concepção está o fato de que as opiniões humanas são absurdamente muitas, diversas, sem poderem ser restringidas a uma única verdade absoluta. Portanto, nenhum valor e nenhuma “verdade” são absolutos. Dentre os sofistas mais ilustres, cito Protágoras de Abdera, para quem “o homem é a medida de todas as coisas; daquelas que são, enquanto são; e daquelas que não são, enquanto não são”, e Górgias, segundo quem “o bom orador é capaz de convencer qualquer pessoa sobre qualquer coisa”.


*Arte de Willim Blake - poeta, pintor e critico social.

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